Opinião

Estocagem de Gás Natural para o Brasil – Considerações técnico-econômicas

Os serviços prestados de uma estocagem de gás natural para a cadeia de valor do gás natural vão muito além da segurança de suprimento do país e da função de complementar a oferta do produto.

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Os serviços prestados de uma estocagem de gás natural para a cadeia de valor do gás natural vão muito além da segurança de suprimento do país e da função de complementar a oferta do produto. Em países continentais como o Brasil, serve para otimização das infraestruturas de transporte de gás natural, e diante de mercados com grande volatilidade da demanda,  oferece a possibilidade de amortizar as flutuações de preços. Em mercados liberalizados pode ser operada como uma atividade independente, servir para arbitragem de preços e introduzir o atendimento à “mercado futuro”, seguindo a sofisticação do mercado financeiro.

As flutuações da demanda de gás natural no mercado brasileiro, em contraste com os volumes regulares de oferta do gás nacional associado ao petróleo, tem gerado uma reflexão sobre  a necessidade do desenvolvimento de capacidade de estocagem.  Observa-se na Figura 1, uma variação de quase 20 Mmm3/d entre os meses de menor e maior consumo. E na Figura 2, que a produção nacional que chega ao mercado, tem sido suficiente para suprir o mercado não termoelétrico.

Figura 1: Evolução da Demanda de Gás Natural

Figura 2: Oferta de Gás Natural ao Mercado Brasileiro – Mm3/d

Analisando-se inicialmente os aspectos técnicos da estocagem, com relação ao perfil da indústria de gás brasileira, e em relação à experiência internacional, verifica-se a necessidade de estudos aprofundados para a escolha da tecnologia mais apropriada. O impacto da produção futura, essencialmente de gás associado, proveniente do pre-sal, situado à longas distâncias, para suprir uma demanda de gás natural ainda incerta, à depender de definições importantes  do setor elétrico, leva à incerteza dos volumes envolvidos, mas reforçam a importância de estocagens de gás natural para o futuro mercado.

Uma análise preliminar dos gráficos acima sugere a necessidade de estocagem para fazer face à demanda do setor elétrico, porém somente o perfil futuro de produção de gás poderá determinar o serviço a ser prestado. Além disto, o setor elétrico já possui reservatórios hidráulicos, o que dificulta imputa-lo mais este custo, principalmente ser for para o desenvolvimento de estocagem subterrânea.

A escolha da infraestrutura de estocagem, considerando o fato do Brasil ser importador de GNL  - Gás Natural Liquefeito, encontra bons argumentos para se defender a instalação que tanques criogênicos em terminais de recebimento de GNL. Os terminais LNG podem regaseificar rapidamente o GNL e injetá-lo no sistema de transmissão. Esta capacidade é fundamental para a agilidade de fornecimento de gás confiável e seguro.

Alguns países, importadores ou exportadores de GNL – Gás Natural Liquefeito acabam optando pela construção de tanques criogênicos próximos aos terminais de exportação ou de recebimento de GNL. Existem mais  de 80MTPA de capacidade de estocagem de gás natural em terminais on-shore de recebimento de gás natural. De acordo com o IGU World LNG Report — 2017 Edition, o custo de investimento destas instalações se situa entre 280 a 330US$/ton. O prazo de construção situa-se entre 4 e 5 anos, condicionado ao tempo de se obter todas as licenças e autorizações, fator muito variável entre os países

Outros países, por possuírem formações geológicas mais adequadas, optam pelo armazenamento subterrâneo que pode ser em reservatórios depletados, acquíferos ou cavidades salinas.

Figura 3: Tipos de Estocagem

É interessante verificar a coabitação tanto na Europa quanto nos EUA das várias soluções tecnológicas, sendo os serviços de tancagem de GNL e de estocagem subterrânea complementares. A tancagem de GNL funcionando como uma fonte de suprimento, enquanto a estocagem subterrânea como um pulmão, onde o gás pode ser injetado no verão e produzido no inverno.

A produção brasileira do pré-sal pode ser de tal ordem de magnitude, que recomende o desenvolvimento destas estruturas subterrâneas, as quais, em geral, armazenam volumes muito superiores à dos tanques de GNL.  Sendo portanto mais adaptadas ao serviço de estocagem sazonal, do que ao serviço de modulação de curto prazo.

A estocagem subterrânea de gás natural é uma tecnologia centenária e amplamente utilizada em um grande número de países.  A primeira estocagem, e ainda em operação, data de 1916, e situa-se no campo depletado de Zoar, próximo a New York. Atualmente existem mais de 680 estocagens subterrâneas de gás natural em operação em todo o mundo, com uma capacidade de estocagem superior a 413 bilhões de m3, ou seja  cerca de 12% do consumo mundial de gás natural em 2015. De acordo com estudos da Geostock esta capacidade de armazenamento pode incrementar para em torno de 600Bilhões m3, em 2025.

Os reservatórios depletados são interessantes para fins de armazenamento porque suas características geológicas já são bem conhecidas. Além disso, os equipamentos subterrâneos e de superfície podem ser reutilizados, reduzindo o custo de conversão.

Dentre os três tipos de armazenagem subterrânea, os reservatórios depletados, em média, são os mais baratos e fáceis de desenvolver, operar e manter. Eles são normalmente, mais rápidos de construir do que outros tipos de instalações de armazenamento, embora testes de injeção e extração devam ser realizada para determinar o comportamento da rocha que será usado para armazenar o gás. A principal desvantagem é que é necessário um maior volume de gás de colchão” do que nas cavernas de sal. A capacidade de injeção e extração é, em media, menor em comparação com outros tipos de instalações. Eles são geralmente utilizados para suavizar a demanda sazonal de gás e para armazenamento estratégico, já que estes podem armazenar grandes quantidades de gás.

Por outro lado, o aumento da exigência de balanceamento (de sazonal para semanal, diário e até mesmo horário) originado pela flexibilidade da demanda e liberalização do mercado, tem desencadeado o desenvolvimento de cavernas lixiviadas de sal, mais adaptadas a uma estocagem flexível.

É importante destacar que a estocagem subterranea é intrinsequamente ligada a geologia de um local. Na maioria das vezes, se constroi o tipo de armazenamento que se pode em relação a geologia local.

O Brasil têm campos depletados que poderão ser convertidos em estocagem de gás natural, e alguns estão  não muito distante dos centros de consumo, mas a experiência internacional indica um longo tempo de desenvolvimento – 5 a 8 anos.

A Agencia Nacional de Petróleo, a Empresa de Planejamento Energético e o Ministério de Minas e Energia tem se antecipado e proposto uma discussão da regulamentação da atividade e outorga dos serviços.

Os seminários, estudos e apresentações sobre o tema, em geral, têm apresentado a estocagem subterrânea de gás natural como a solução para a indústria do gás no país.

Ocorre uma questão importantíssima que não pode ser minimizada: o necessário alinhamento de preços no mercado energético brasileiro, de forma que a infraestrutura possa ser remunerada pelos serviços prestados. O que para atração de investidores privados precisa também ser referenciado ao mercado internacional. Alguns estimam o custo de estocagem entre 3 a 5% da fatura de gás, à depender do nível de modulação e interrupção.

Figura 4: Custos de Investimento em Estocagem de Gás natural

No armazenamento em campos depletados ou acquíferos, o volume útil de estocagem pode situar entre 0,5 até 1 Bm3, diluindo o custo do gás “colchão”  bastante elevado, enquanto as cavernas salinas são de menor capacidade – volume disponível entre 0,3 a 0,5Bm3. Para projetos de pequena capacidade o custo final estará no ponto mais alto da faixa da Figura 4 acima.

Ressalte-se que os valores acima representam o agregado de custos de projetos realizados e atualizados à dólar de 2016. A estocagem subterrânea por ser um objeto geológico, por natureza, cada projeto é diferente, sendo difícil realizar extrapolações a partir das médias acima apresentadas.

A decisão de investimento precisará levar em conta ainda, o serviço que deverá ser prestado pela estocagem, porque um item importante da flexibilidade é o tempo de entrada da estocagem no sistema: extração de gás (send-out capacity); frequência – horária, diária, semanal, mensal; etc , além do dimensionamento da capacidade, e da ocorrência de estrutura geológica adequada.

Dado os longos prazos para execução deste tipo de infraestrutura, é preciso que os estudos sejam aprofundados, para orientar as decisões dos investidores.

 

O Brasil com certeza precisará de estocagem de gás natural para garantir a confiabilidade do suprimento, e o ideal seria um portfolio de soluções tecnológicas , para assegurar capacidade de armazenamento e flexibilidade.

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